Nós, pesquisadores indígenas, reunidos
com nossos caciques, lideranças e aliados da causa indígena, por ocasião da
3ª SBPC Indígena no âmbito da 68ª
Reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC, nos
dias 03 a 08 de julho de 2016, em Porto Seguro - BA, vimos a público denunciar,
e repudiar, os retrocessos aos direitos dos povos indígenas e expressar a
defesa incondicional desses direitos.
É
inadmissível, no âmbito do Estado democrático de direito que sejam violados os
direitos originários garantidos tanto na constituição brasileira quanto nos
instrumentos jurídicos internacionais dos quais o Brasil é signatário.
Diante do exposto, repudiamos:
•
O sistemático desaparelhamento do órgão
indigenista - Fundação Nacional do Índio (FUNAI) que ora culmina com a
indicação do general Roberto Sebastião Peternelli Junior à presidência do
órgão, considerada uma afronta à autodeterminação dos povos indígenas;
•
O Projeto de Emenda Constitucional 215 e
o Projeto de Lei 1610, por atentarem frontalmente contra os direitos dos povos
indígenas;
•
O uso da violência policial e os
recorrentes assassinatos, que permanecem impunes, de líderes indígenas;
•
A
criminalização de lideranças indígenas com o uso de prisões temporárias que se
estendem por meses, sem audiência de tutela;
•
A sistemática negação dos direitos
sociais - a educação diferenciada acesso e permanência no ensino superior em
todos os níveis, saúde, saneamento básico e água potável - especialmente às
comunidades indígenas que se encontram em áreas de conflito e vulnerabilidade,
como os Guarani-Kaiowá;
•
O descaso e a omissão das autoridades,
diante da tragédia socioambiental do Rio Doce, provocada pelas empresas
mineradoras – Samarco e Vale – atingindo diretamente a sobrevivência dos povos
indígenas Krenak, Tupiniquim e Guarani;
•
O não cumprimento da Constituição Federal
no que concerne à proteção dos povos indígenas e à demarcação dos seus
territórios tradicionais, principalmente nos casos dos Guarani-kaiowá; Pataxó
das T.I. de Barra Velha do Monte Pascoal e Comexatiba; e T.I. Tupinambá de
Olivença;
•
Qualquer tipo de retrocesso aos direitos
garantidos constitucionalmente na Educação Escolar Indígena diferenciada,
específica, intercultural, bilíngue e comunitária. Expressamos, portanto, pleno
apoio aos professores indígenas, defendemos a manutenção de todos os programas
voltados à educação escolar indígena, exigindo que o Estado brasileiro, por
meio do Ministério da Educação, Secretarias estaduais e municipais de educação,
assuma os Territórios Etnoeducacionais e realize a II Conferência Nacional de
Educação Escolar Indígena;
•
Qualquer tentativa de retrocesso com a
implementação da Base Nacional Curricular Comum, em relação às orientações
curriculares e às Diretrizes Nacionais da Educação Escolar Indígena Específica
e Intercultural, já garantidas em marco regulatório. O governo deverá garantir
as especificidades culturais, identitárias e do Bem Viver dos povos indígenas
do Brasil;
•
A implantação de projetos ou medidas que
interfiram nos hábitos, costumes e organização sócio-política dos nossos povos
sem a consulta prévia, conforme estabelece a Constituição Federal, a Convenção
169 da Organização Internacional do Trabalho, a Declaração das Nações Unidas
Sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a Declaração da Organização dos Estados
Americanos sobre os Povos Indígenas.
•
A utilização dos meios de comunicação,
concessões públicas, para a pregação do ódio, da divisão, do racismo e da
discriminação, principalmente contra os povos indígenas. O respeito à
diversidade étnica e cultural deve ser balizador das atividades destes meios e
qualquer infração deverá ser punida pelo poder público. Não podemos confundir a liberdade de
expressão e de opinião com o direito de atacar a integridade e a honra de
cidadãos ou de povos indígenas, a exemplo do que aconteceu recentemente com o
povo Maxacali, para o que exigimos reparação;
•
Todas as formas de genocídio e violação
de direitos, atentados contra a vida, crimes hediondos conforme o Artigo nº 07
da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos povos indígenas, em que
se afirma que “os povos indígenas têm o direito coletivo de viver em liberdade, paz e
segurança, como povos distintos, e não serão submetidos a qualquer ato de
genocídio ou a qualquer outro ato de violência“.
Considerando que
tivemos visíveis avanços no campo dos direitos formais nas últimas décadas,
nossos povos e lideranças não permitirão que grupos conservadores da sociedade
brasileira retirem e anulem tais direitos, conquistados à custa de muita luta
nossa e dos nossos antepassados. Os avanços conquistados pelos nossos povos
são, também, o avanço da sociedade nacional à qual pertencemos. Nossos direitos são a busca da superação de
uma subalternidade cultural e econômica imposta pelo sistema colonizador sobre
nossos povos e por extensão a toda a população brasileira. Não há recuo possível! Não há golpe que consiga impor ao povo
brasileiro o retrocesso à sua dignidade e, aos povos indígenas, a redução dos
seus direitos.
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